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TEMPORADA 2 - EPISÓDIO 4

Bernard de Luna

Temporada 2 Episódio 4 – Bernard de Luna
PROJETO: Desenhando Produtos
TRANSCRIÇÃO: Lady González

Bernard De Luna possui mais de 20 anos de experiência com produtos digitais. Sendo Head de Produto na ThoughtWorks, Fundador da Produtos Incríveis, Coordenador da primeira Pós-graduação em Product Management do Brasil, e um dos maiores criadores de conteúdo sobre Product Management do Brasil.

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Hoje vamos falar com Bernard de Luna.
 
Bernard – Estou muito feliz de estar aqui, gente! 
 
A gente sempre pede para o convidado se apresentar, contar sua história. É super livre para você falar o que você quiser, cara. O tempo é todo seu e a gente só vai aproveitar.
 
Bernard – Olha que responsabilidade. Bom, tem algumas coisas que eu gosto de falar que marcam muito a minha vida. A primeira delas é uma herança de família, que é meu pai e eu avô. Meu avô fez carreira como químico de refrigerante, meu avô inventou o refrigerante. Viajou o mundo todo sem nenhum aprendizado formal de idioma e ele sabia falar não sei quantos idiomas, foi para o Japão, Estados Unidos, foi um dos criadores do Crush, na época pela Brahma, depois teve a AmBev, então, eu via isso em casa, me trazendo pastilhas de sabores diferentes de refrigerante, que ele tinha inventado e que nem foram para o mercado, sabe? Refrigerante de banana, de jabuticaba, de manga, coisas muito estranhas. Mas era muito legal, isso me marcou muito como criança.

 Ainda sobre família, meu pai tinha 3 empregos para sustentar a casa quando ele era casado com a minha mãe. E isso foi uma coisa muito forte porque meu pai ainda tinha tempo de inventar coisas. Meu pai era aquele cara que quando o carro quebrava, ele desmontava o carro inteiro, montava o carro inteiro, o carro voltava a funcionar e por algum motivo sobrava peça no chão e a gente nunca sabia de onde eram aquelas peças. Meu pai é um grande inventor, na época a gente ia muito à pista de Autorama, aí meu pai gostava muito de carro, meu pai como trabalhava com peças, com coisas da Telerj, era a operadora de telefonia que tinha na época do Rio de Janeiro, cada estado tem o seu. 

E aí meu pai criou um controle de Autorama de acrílico. E ele botou tudo, as molinhas para dar condução, tudo, fez do zero. E a gente podia ir lá no fim de semana para poder usar e corria mais que os outros carrinhos, meu pai inventava coisa. Meu pai chegou a criar maquete de ping-pong de acrílico, uma raquete transparente e invisível. Então, eu tinha muitas referências legais e criativas dentro de casa, isso me ajudou muito. E saindo da família, tem uma coisa que eu falo que foi a divisora de águas da minha criatividade, que foi uma das matérias que eu tinha no meu primário, poucas crianças que eu conheço tiveram essa oportunidade, eu tinha aula de gnomos e duendes. Eu juro para vocês, a minha escola era incrível, para vocês terem ideia, algumas aulas de educação física da minha escola eram no Maracanãzinho, do Maracanã, era fantástico, fora do normal essa escola, mas uma das aulas era de gnomos e duendes, a gente sentava numa salinha e ouvia histórias de todos os gnomos, que cada gnomo fazia com essa pedra, para a gente isso era mágico. 

Entrei nesse mundo de magia, comprei essa ideia de magia. Eu desenhava, pintava, era uma criança muito louca, muito artística, eu era introvertido. A minha diversão era pintar, desenhar, era fazer massinha, escrever histórias. Com 11-12 anos eu escrevia histórias para a escola, romântica às vezes, eu era um cara apaixonado. Eu sempre tive, a internet é um canal para mim, ainda é um canal da minha loucura, de eu pegar as coisas que estão na minha cabeça, a vida era elas e a internet me ajudou a dar vida, para que mais pessoas vissem. Com a internet, foi o que me fez entrar na internet, eu fiz a mesma coisa que eu fazia quando tinha 8 anos de idade. Sabe o que era? Sentava na janela da minha casa, que eu morava, fazia desenhos e jogava pela janela porque tinham uns adolescentes brincando na calçada na frente da minha casa, eu jogava o desenho para eles. 

A internet é a melhor coisa para mim até hoje, é onde eu faço alguma coisa, eu jogo para as pessoas que eu quero que consumam. Sem romantismo nisso, era exatamente assim que eu fui fazendo minha vida, comecei a criar sites para poder botar meus desenhos online, percebi que desenhar site é muito legal, comecei a desenhar muito site e descobri o Flash e comecei a desenhar sites animados, com GIF, motions e etc, comecei a fazer ilustrações 2D, descobri que com CSS eu podia fazer as mesmas ilustrações e até simulação de 3D, comecei a perceber que eu tinha um quê de show case para as pessoas, assim que eu consegui pegar uma coisa que era básica, que todo mundo sabia falar sobre esse assunto e dar uma roupagem diferente, ou seja, trazer o goblin e o duende. 

E eu comecei a fazer isso com conteúdos. Eu faço isso desde 2007, 2008 que eu pego um conteúdo e dou uma roupagem diferente e reapresento isso para as pessoas. E foi isso que comecei a fazer, faço isso ajudando as empresas, a se reciclarem, a trazerem estratégias num nível muito alto. Traduzo isso de forma muito mastigada para as pessoas, principalmente para pessoas de produto que me conhecem. E eu me divirto, até hoje eu sou igual a aquele garoto, não mais introvertido, mas eu sou o mesmo garoto que sentava no parapeito para poder conseguir desenhar, conseguir dar os desenhos para as pessoas, isso me marca muito, ser mais uma pessoa da minha família a ser inventor, isso inspira meus filhos para poder fazer um dia a mesma coisa, criar as mesmas coisas se eles quiserem obviamente. Mas o que eu faço nas empresas é ajudar a inventar coisas, basicamente essa é a minha missão no mundo.
 
Você falou uma coisa que eu particularmente procuro trabalhar bastante no dia-a-dia, não sei se as pessoas sabem, mas nós trabalhamos na mesma empresa, na Totvs. Nunca tinha trabalhado com o Bernard antes. Mas uma coisa que eu puxo muito no dia-a-dia, seja numa cerimônia mais pesada, numa cerimônia mais diária que é aquela coisa de a gente se divertir. O próprio Caroli fala isso, ele tem um produto chamado Funretrospectives, agora virou EasyRetro, uma ferramenta para fazer cerimônias. Na sua visão, qual a importância de a gente se divertir no trabalho? 
 
Bernard – Para mim é tudo, eu não consigo imaginar um time brigado, um time que não funcione. Para mim, a liderança passa pelo canal de energia, quando você lidera alguém, você lidera por energia. Essa energia pode vir através de influência, pode ser através de comunicar um objetivo em comum, pode ser energizadora, pode ser motivadora, engajadora, mas uma energia. E a melhor forma de você energizar uma pessoa, é através da gameficação. Quando é um jogo, você se engaja mais, existem alguns perfis de jogadores. Tem a pessoa que sempre vai querer ganhar, tem a pessoa que gosta de jogar em grupo, aquela pessoa que gosta de jogar sozinha. Mas são jogadoras. Se você consegue trazer a diversão para o seu dia-a-dia, o seu dia-a-dia fica mais energizado. 

E quando você tem um problema real, o seu time se dá mais 30% do que ele poderia se dar para ajudar a resolver o problema, porque ele lembra como é momento bom da coisa, sabe? Vocês estão tão juntos nos momentos positivos, que quando acontece um momento negativo, as pessoas se juntam para resolver. Eu tinha isso com times que sempre atuaram diretamente comigo. Não é à toa que todo mundo que foi um liderado meu, um colaborador do meu time, até hoje são meus amigos pessoais, no WhatsApp de conversar e de sair para tomar uma coisa, pré-pandemia obviamente. Então, é normal, eu acho que é meu jeito de trabalhar, concordo plenamente com isso, acredito que um livro é sempre chato, seguir o livro é sempre chato, fazer uma retrospectiva como o manual fala de fazer um Eduscrum, por exemplo, fazer um review, fazer um plan, gente, isso é chato. Isso é chato! Só que existe uma forma de se tornar mais positivo. 

Então você sempre tem que colocar uma pitada de alguma coisa. Então, conte de uma forma diferente, peça para alguém contar uma história antes, mostre vulnerabilidade, mostre como foi sua semana, seu dia, o que você está sentindo hoje, conte uma piada. Por exemplo, toda comunicação que eu fazia para o meu time de stakeholders de uma empresa que eu passei, toda comunica o que eu fazia, eu acho que era mensal, eu começava com uma piada para quebrar o gelo. 

Quando as pessoas veem uma mensagem minha, elas sabem que é minha antes de ler meu nome. Porque você começa gerar identificação. Então, eu sou super engajado em relação a isso, eu acho que tudo tem que ser divertido, o mundo já é difícil demais para a gente ser preto no branco, o mundo já está difícil demais para a gente ser muito sólido, muito rígido nas coisas. A gente tem que ser um pouco mais leve, trabalho dá para ser divertido, não precisa ser como antigamente.
 
E você falou uma coisa, resolver problemas, por isso se chama trabalho, senão ia se chamar churrasco com cerveja na piscina. Por isso que se chama trabalho, porque a gente foi chamado para fazer um trabalho e ter um problema para resolver ali. Eu queria te perguntar em relação a um conceito que eu escutei no passado sobre product manager, onde o PM, a pessoa gestora de produto é responsável por entender o problema e o designer é responsável por pensar na solução. O que você acha desse conceito? 
 
Bernard – Olha, eu não concordo com essa visão. Definir um problema é um dos trabalhos que uma pessoa faz, na verdade, não é um trabalho, é um time, liderado por uma pessoa. O campo de missão é um campo de oportunidade, é um campo em cima de uma estratégia que foi definida. Toda solução parte da premissa que na verdade, ela é uma hipótese. Então, a gente não sabe se ela vai gerar valor ou não vai gerar valor, toda entrega ela é um fim, ela é um meio de um aprendizado de um processo (inaudível). Então, a gente não pode falar que o time de designer responsável pela solução, porque a solução ela faz parte de um método científico, faz parte de um processo, esse processo não início, meio e fim, não é tão sólido como (inaudível), por exemplo. 

Então dentro da minha concepção, produto é responsável pelo porque, ele é responsável pelo o que. Porque está no problem space, é definir o problema, entender o problema, fazer um diagnóstico, entender se a tendência está ligada ao problema de ele aumentar ou diminuir criticidade, periodicidade, frequência, profundidade, tem várias coisas que a gente pode fazer sobre problema. Nessa camada de resolver uma solução, a gente passa pelas oportunidades, que basicamente é uma porta do desesperado do Sérgio Malandro, não sei se as pessoas são dessa época, mas basicamente é você escolher qual a porta que você vai abrir para saber se existe um outro cidadão do outro lado. 

É isso, como as pessoas falam: não sei o que é uma área de oportunidade e soluções. A pessoa fala: porta dos desesperados do Sérgio Malandro, você quer a bicicleta, mas você tem que escolher uma decisão, qual a porta. Qual a porta que você aposta que está a bicicleta? É a mesma coisa, você quer resolver o problema, qual a porta que você escolhe e que você acredita que vai resolver esse problema. Você escolhe a sua oportunidade. E dentro dessa oportunidade existem várias soluções, se design é responsável pela solução, quem tomou essa decisão de todas as soluções? Então, você tem que colocar numa matriz, essa matriz vai definir qual solução faz mais sentido para esse momento, uma aposta com menor risco, nesse processo muito científico para ser uma pessoa definida, vejo quando falam de processo, não estou falando de produto, de design, eu estou falando que é uma ferramenta que vai definir, é o processo que vai definir. 

E esse processo vai voltar vários segmentos, engenharia, produto, design, porque é assim que você consegue com o time, atacar o problema. E a pergunta fica: mas se produto liga com porque e liga com como, onde design liga? Design participa um pouco do porque, design participa do porque, porque ele também tem o trabalho de pesquisar o problema. Quando o time de design faz uma entrevista de discovery com o usuário, ele está entendendo o problema. O papel de UX Research é exatamente entender o problema, então, participa do Ok? Não, porque essa decisão de bancar vem de produto. E qual a outra afinal do design? O como. A partir do momento que chegamos à solução que foi melhor priorizado e assim foi definida, como será a entrega? Como ela vai chegar na mão do usuário? Como ela será ponto de interação com o usuário? Essa é uma decisão de design e produto não entra, produto não tem que participar da compra, então, para mim é: o que é só o produto, por que? 80 a 20, 60 a 40, 50 a 50, depende dos perfis e o como é 100% design.
 
Na sua visão, como vê a relação do product manager, o tech leader e o Project Designer? Como eles devem trabalhar? 
 
Bernard – Para mim isso está exatamente nessa etapa, de avaliação e solução que a gente falou. Vou falar de um caso, quando você está definindo todas as soluções possíveis para uma oportunidade, você precisa priorizá-las, porque você vai encontrar ideia e soluções. É muito fácil dar ideia de solução. Uma opor idade, vamos melhorar o on boarding, beleza. Como eu faço isso? Podemos fazer isso através Wizard, podemos fazer isso através de um FAQ que fica num poster no final da tela. Podemos fazer isso colocando uma pessoa de CS ligando para todo cliente novo, agendando uma reunião para apresentar a plataforma. Podemos fazer isso com um vídeo de entrada do Modal fazendo um all thru pelo produto. 

Olha quantas possibilidades a gente pode fazer para melhorar o on boarding. Essa é a grande beleza de sugerir ideias. Então a gente tem N soluções para cada oportunidade. Dentro dessa oportunidade, a gente precisa priorizar e vamos supor que você use uma matriz rice ou ice, então dentro da matriz, vamos entrar no rice, dentro da matriz de rice você teria primeiro o alcance, ou seja, se o seu produto tem escalabilidade, se seu produto tem muitos usuários, alcance faz sentido. Se por acaso você tem um produto B2B ou um produto com um começo de jornada, com poucos usuários, o R não faz sentido para você, abre mão do R e vai para o ice, você faz pequenas mudanças nas letras só para poder ficar mais fácil. De um lado o I é impacto, do outro lado o I é importante, mas é a mesma coisa. De um lado, ele usa É como esforço e do outro lado ele usa É como Easy, como facilidade, que é o inverso do esforço. Gente, é a mesma coisa, então, simplifica, usa o mesmo sistema. Mesmo a simplificação, você tem impacto ou importância, confiança e esforço. Vamos nessa linha de raciocínio, esforço. 

A pessoa de produto não é responsável pelo combo, então por que essa pessoa deveria priorizar o esforço de uma tarefa? Concorda comigo que é um jogo de mentiras, você como gestora de produto, você não está habilitada de estimar esforço de nada, você não é a especialista da execução. O que você tem que fazer? Chama a tech lead e chama a designer. “Oi meus amores, tudo bem? Eu preciso que vocês estimem para mim esse esforço”. E a pessoa vai fazer a devida estimativa. E tem várias rands que você pode usar na internet e que dão sugestão de notas para você poder se embasar e você entender o que é 5, o que e 4, o que é 3. Beleza, resolvemos o problema de esforço, o time de engenharia e o time de design que definem o esforço, se você ainda quiser, pode ir para outro nível. 

O que é importante para mim em esforço? Engenharia ou design? Para mim é engenharia. O que eu faço? Eu multiplico a nota de engenharia por 1.2 ou 1,4, só para dar um peso maior para o esforço de engenharia. E aí a gente chega em confiança. O que significa confidence? O quão confiante você está para implementar esse item. Implementação é: combo. Você é responsável pelo combo? Não. Quem vota confiança? Tech lead e design. Porque você vai multiplicar essa nota de esforço, você vai multiplicar pela porcentagem de confiança que você tem pela solução. E aí sobra uma letra: impacto. Quem responde isso? Produto. Isso é bom para quebrar a falácia que produto toma decisão sozinho e que o produto que vai dizer, ela é a facilitadora, vai liberar a iniciativa. 

Mas não necessariamente ela toma a decisão sozinha, porque se ela coloca uma matriz, ela tira isso dos seres humanos, dos egos, dos vieses, mas a gente consegue tirar um ponto de poder tirar uma estrutura de escalabilidade, uma estrutura de pensamento escalável. Nesse caso, tech lead e design participam mais da priorização que produto. E se for o caso de confiança, você poderia fazer o inverso, dar a nota por 1.2 ou 1.4 para design, porque design tende a ter mais riscos, principalmente risco de valor ou risco de usabilidade de usuário e pode acontecer a seguinte coisa: você pode descobrir que um item específico tem um maior impacto do mundo. Ele é super impactante, ele é gostoso, é o item que com certeza estaria em 1º lugar. Mas infelizmente ele tem baixa confiança. 

E se por algum motivo que você ainda não tem certeza o que é porque não começou com tech lead e com design, ele não vai ser priorizado para próxima sprint. Só que ele tem um alto impacto, nesse momento é que você faz o alinhamento com tech lead e com design, fala: “por que esse item ficou com baixa confiança”? Se for por uma perspectiva técnica, tech lead vai falar: “a gente não sabe se consegue implementar esse item”. Então ele apresenta um grande risco técnico, legal. Vamos fazer o seguinte: ele não vai para essa sprint, você vai usar esse sprint para fazer uma pesquisa em cima dele, técnica, POC, você vai ver se bate só para ver se é factível. Se for factível, você muda a confiança dele e na próxima sprint ele vai estar pronto para ser implementado. Se por acaso, quem deu a nota baixa de confiança não foi a tech lead, foi a designer. O que você faz? designer, bola um artefato de pesquisa, você vai definir o melhor artefato para você fazer essa pesquisa para reduzir o risco de valor para o risco de usabilidade para o usuário. 

No próximo sprint, vai mudar a nota da confiança, vai ter um grande impacto e uma grande confiança. Esse item vai naturalmente para o backlog para ser implementado. Então, a participação de relacionamento de produto, design e tech lead, ele acontece de uma forma muito sistemática. Eles têm que participar ativamente do Discovery, onde eles participam ativamente da priorização e que produto é só um removedor de obstáculos, é importante para trabalhar a estratégia e entender principalmente, quando a gente fala que é a empresa não me dá autonomia para trabalhar com estratégia. Se você não pode pegar a estratégia, que pelo menos entenda que release não é o fim, que depois dessa solução, você está monitorando o critério mínimo de sucesso dela para saber se ela entregou o valor que deveria ou não entregou o valor. Se você segue esses entendimentos, produto fica muito mais gostoso de trabalhar e o relacionamento entre essas pessoas empodera muito. Um empodera o outro, que empodera o outro, vira um círculo virtuoso. 
 
A gente acabou ter uma aula sobre liderança e negociação, como tralhar com produto, gerenciando, liderando e dando autonomia para as pessoas trabalharem com tecnologia e design na mesma equipe. Você acabou de entrar numa nova empresa, você saiu de um ambiente onde provavelmente você já conhecia as pessoas, tinha sua ordem, seu método, suas cerimônias e você chega em outra empresa, com outro desafio, assumindo um cargo específico. Qual a sua filosofia quando você chega numa nova empresa, o que você faz? Onde você presta a atenção? Onde coloca sua energia dali em diante?
 
Bernard – É a que eu mais recebo no Instagram. Esse é o tripé mágico, ele consiste em primeira coisa, foca sempre em quick wins, muita gente fala: “o que é quick wins”? São pequenas vitórias, vitórias rápidas, é melhor você pegar uma tarefa que vai se envolver, que vai demorar três meses para ficar pronta, do que pegar uma tarefa que dura um dia, que dura no máximo uma semana e você está entregando. 

Pegue coisas curtas, rápidas, vitórias rápidas para mostrar atração, para você mostrar que você foi a aposta certa da empresa. E muitas vezes se você pegar uma tarefa muito longa, a empresa pode não ter confiança se você vai entregar ou não. E vale lembrar que você tem 3 meses para dar certo senão a empresa te tira super tranquilo. Quick wins é a melhor forma de você mostrar para a empresa que eu sou uma aposta certa, olha meu poder de entrega, fica tranquilo, vai dar certo, o quick wins e o primeiro foco, você não entra numa empresa para você ousar no primeiro jogo, você entra para aprender, aprender os limites, as culturas, os valores, as pessoas, os processos. A segunda dica do tripé é documentação, tudo o que você tocar pela primeira vez, documente e isso é uma coisa que se perdeu muito nos últimos anos principalmente por conta da má leitura ou interpretação de agilidade onde as pessoas acham que documentação é uma coisa ruim, mal sabe ela o quanto é importante a documentação. 

Então é uma má interpretação, as pessoas não entendem que documentar o front que é a crítica, a questão da brincadeira é que você precisa documentar tudo o que tocar pela primeira vez, para encontrar falhas no processo e essas falhas vão te ajudar a você dar feedback para a empresa. E todo mundo que está na empresa, ama quando a pessoa entra e começa a dar feedback, porque ela mostra que vestiu a camisa, mostra que se importa, está ajudando a empresa a ser melhor. Dois, você não faz a mesma pergunta para seu líder ou sua líder, porque se você documentou a primeira vez, quando você tiver dúvida, você vai primeiro lá. 

A pior coisa para um líder ou para uma líder, é quando você fala para a pessoa que ela tem que fazer, você fala o que ela tem que fazer, tira a dúvida e na semana seguinte a pessoa faz a mesma pergunta para você, por que? Porque você descobre que se passaram 5 dias e a pessoa não fez nada ou ela ficou batendo cabeça tentando fazer uma coisa que ela tentando fazer uma coisa que ela deveria ter anotado para não precisar bater a cabeça. Então, documente, todo seu aprendizado. E a terceira parte, é que quando você documenta, você aprende, aprende mais. Quando você está ali, assistindo alguém, ouvindo alguém e você está documentando aquilo e depois você coloca um documento público, você teve um trabalho de revisão e isso ajuda a memorizar e compreender o que você tem que fazer. Então entra uma nova pessoa na empresa, ela vai poder ler seu documento, o on boarding vai ser muito melhor para as próximas pessoas, essa é a importância da palavra documentação. E o terceiro item que é o que eu falo muito, trabalhar em cima de bad Jobs, o trabalho ruim, que ninguém quer fazer, é lavar a louça da sua casa, ninguém quer tirar o lixo do banheiro, ninguém quer fazer. 

Se você entra numa empresa hoje, você tem a chance de fazer essas coisas que todo mundo que está lá não quer fazer. E quando você chega para a sua líder e pergunta: “você está precisando de ajuda? Eu vi que você numa reunião tal. Quer que eu vá para transcrever a reunião para você? Eu vi que você vai ter que conversar com o fornecedor, quer que eu faça o documento e depois te passo as transcrições”? É isso, sabe? É fazer o trabalho que ninguém quer fazer. Porque quando você faz isso, a pessoa fala: “posso confiar nela”, é o que a gente chama de coração para servir. Você tem um coração para servir as pessoas. Se você for, não tem problema, porque é muito bonito isso, mas é o fato de você mostrar para as pessoas, “quero te ajudar, conta comigo, se você tiver precisando de alguma coisa, lembre-se de mim, estou aqui para te ajudar”. 

Essa para mim é a coisa mais bonita, você entrega as coisas rápidas, se você documenta seus aprendizados e se você faz um trabalho ajudando as pessoas a focar, ajudando elas a utilizar o tempo, você vai ser amado pela sua empresa. E a empresa vai te dar muito mais autonomia nesses 6 meses, então, essa é a minha dica. O que eu dou, somando ao que eu faço, que é uma coisa que eu gosto bastante, quando você entra numa empresa, a dica mais legal fora essas três que são necessárias, faça pelo menos 10 reuniões, convenções diferentes na sua empresa, de quais produtos? Converse com o tiozinho, com a tiazinha do financeiro, converse com o tiozinho, com a tiazinha do design, converse com todo mundo que está nas áreas, com as 10 pessoas que você poderia conversar. Por que eu chamo isso de beach head Discovery? 

Lembra da guerra da Normandia que eles tinham que atracar numa praia e aí montar todas as barreiras atirando nos barcos que estavam chegando na praia? Pois é, beach head é a cabeça de praia, é a primeira tripulação, é o primeiro batalhão que o pelotão chega na praia. O objetivo deles é conseguir tomar aquele espaço para permitir que os próximos pelotões cheguem também, quando você chega numa empresa, você tem que ter o entendimento de tudo para você conseguir chegar com todo seu conhecimento, toda sua bagagem, todo seu arsenal. A primeira coisa que você faz é: acampe. Como você faz esse acampamento? Descobrindo as outras pessoas. Você chega numa pessoa e fala: “Oi, tudo bem? Sou novo aqui, você pode me explicar o que você faz? O que é sucesso para você e como posso te ajudar”? E você faz as mesmas três perguntas para todo mundo que você conversar. Te garanto, certeza absoluta, fazendo essas coisas em seis meses a empresa toda te vê como uma pessoa de excelência.
 
Quais as características que você busca em alguém que você está contratando?
 
Bernard – Varia da pessoa, do papel, do cargo. Busco pessoas que pegam o problema para si, a pessoa que pega a tarefa e vai fazer a tarefa dar certo, ela vai pegar a tarefa para ela. Isso é uma coisa que eu valorizo muito. Dois, pessoas que gostam de debater coisas. Acredito que a linearidade para mim é muito burra, porque seu eu falo uma coisa e a pessoa fala: “vou fazer”. Nem parou para pensar se faz sentido ou não, sabe? Eu não quero uma pessoa executora, eu quero uma pessoa por si só, um ser pensante. É bom ter debate, é rico. Eu adoro debater, então, eu valorizo muito pessoas que estão dispostas a debater. E pessoas que gostam de ensinar. 

Eu faço uma pergunta em todos os recrutamentos que eu faço, eu pergunto: “o que você pode me ensinar que eu não sei”. E essa é uma pergunta muito poderosa. Porque muita gente fala: “posso te ensinar kung fu”. Sensacional, eu quero aprender. “Posso te ensinar a descer a ladeira com o carrinho de rolimã”. Sensacional. É bonito isso, quando a pessoa te mostra que ela tem uma capacidade de te ensinar algo, você sabe que ela vai ter um efeito legal no seu time, ela está disposta. Você imagina, junta 8 pessoas numa sala e fala: o que cada um me respondeu numa entrevista de entrada? Agora se ensinem. Olha que legal fazer isso com o time, vai liderar um time que as pessoas se ensinam coisas. Eu valorizo isso, poder de debate, participação com certeza, a questão de ensinar alguma coisa para alguém, aprender e ensinar, é vital para um time.
 
Hoje a gente não falou do seu cargo, você é head de produtos na ThoughtWorks, quais são suas principais atribuições que um head de produtos tem hoje?
 
Bernard – A posição que eu tenho hoje é bem diferente, se é na ThoughtWorks ou em outra empresa que tem produto próprio porque a gente está numa empresa de consultoria, existem contas, existem engajamentos, existem times. Meu papel não é influenciar diretamente na conta, meu papel é influenciar indiretamente na conta. É muito diferente, por exemplo, de uma head de um produto só, de um aplicativo ou alguma coisa assim. Porque o papel dela é influenciar a estratégia no produto que ela está relacionada. É um desafio bem interessante, eu falo que meu produto é a comunidade. Isso é muito bonito, dá para gerir numa comunidade? Eu consigo gerir numa comunidade um produto? Sim. Se você tiver as ferramentas certas, os apoios e uma transparência no debate, com certeza você consegue fazer.

 Esse é um desafio que eu tenho hoje, um é desafiar o status quo de produto dentro de uma consultoria, gestão de produto dentro de uma consultaria dois é reter os melhores talentos e as pessoas que podem agregar um grande valor, tem muita gente muito boa na nossa comunidade, tem gente ali, que eu faço várias reuniões por semana, mas tem reuniões que eu faço e falo: “meu deus, como eu não conhecia você antes de eu entrar na ThoughtWorks? Que trabalho maravilhoso”. Reter essas pessoas é necessário, entregar mais valor para essas pessoas é necessário, entender qual momento da carreira dela e o que elas estão buscando para dar o próximo passo nessa carreira e eu poder ser esse motor de transformação, de permitir que elas deem esse próximo passo, isso para mim é muito bonito. 

Então, eu tenho hoje um desafio, respondendo essa pergunta, eu tenho três coisas que são claras: servir a minha comunidade. Segundo: encontrar novos engajamentos que toquem estratégia de produto, que toque product Discovery, que toque idea to market, que a gente consiga colocar essa disciplina de estratégia de produto dentro de mais e mais empresas, coisas que a gente faz com excelência no mundo inteiro. Tem dezenas de cases dessa transformação de produto, de inovação, que a gente consegue fazer para as empresas. Fazendo isso a gente consegue pegar essas pessoas incríveis que estão na comunidade e a gente consegue colocar oportunidades também, a gente gera valor para as duas pontas. E a terceira parte do meu trabalho, é garantir que as contas que a gente tem atualmente antes da minha entrada, que elas estejam aproveitando o máximo que a gente pode entregar como comunidade de produto. “Nossa, essa pessoa está fazendo um trabalho magnífico de métricas de produto”. Os outros times dessa mesma conta sabem disso? Outros times de produtos de outras pontas sabem disso? Vamos pegar essa pessoa e vamos dar visibilidade a ela? Vamos fazer ela compartilhar esse conhecimento com outros times e a gente começa a gerar esse crescimento de conhecimento entre pessoas, entre times, entre empresas e entre contas.

 É um trabalho de articulação, onde eu devo aparecer cada vez menos, porque quando a pessoa tem um conhecimento, ela que gerou conhecimento, eu tenho que dar visibilidade para ela. Um case muito legal sobre isso, uma product manager nossa chegou e falou: “tem um evento muito legal chamado women in product, online que eu gostaria muito de fazer. É um evento só de gestoras de produto, quero muito participar e vocês conseguem me ajudar de alguma forma”? E eu falei: “claro, a gente não sabia e não colocou ninguém ainda. A gente vai patrocinar 100% desse evento para você e em troca vou te pedir para documentar esses aprendizados e se possível, compartilhe com as outras mulheres do grupo”. Porque se isso der certo, ano que vem a gente pode colocar 5 pessoas para irem, 10 pessoas para irem, por que não? Ou mais”. 

Ela foi no evento, participou de todas as talks, anotou brilhantemente todos os aprendizados de todas as palestras, trouxe, ela foi uma das talks que apresentou todos os aprendizados do evento. Ou seja, ela capilarizou o conhecimento dela, não satisfeita em fazer isso, transformou isso em artigo e vai sair no blog interno da empresa. Esse para mim é o ganho, colocar luz nas pessoas para poder trabalhar conhecimento e crescer cada vez mais a qualidade e a excelência na nossa comunidade. E liderar 100 pessoas de produto meu amigo, é um desafio sensacional, escalar excelência é um grande desafio de produto.
 
Tem muito a ver com o conceito, é muito difícil. Na teoria parece ser simples, mas na prática é algo difícil de ser construído, quando o líder não se coloca nos holofotes, mas ele dá um impulso para que as pessoas brilhem no palco. Na verdade, ele está ali atrás dando todo apoio para que aquilo de fato, aconteça. Tem uma questão de abrir mão de ego, de uma série de sentimentos, que nós temos. Tenho que abrir mão disso para colocar em prol da pessoa que é minha liderada, que vai me ajudar a construir a comunidade, isso é muito de verdade, porque é um negócio que eu estou vivendo junto e eu vejo como isso é bacana dentro da empresa. É um negócio diferenciado. 
 
Bernard – Josias, é isso. Eu não consigo conversar com 100 pessoas. Não consigo criar um programa de mentoria que eu consiga mentorar 100 pessoas. Só se fosse uma mentoria em grupo, mas ainda assim me tomaria muito tempo. E um daqueles outros pilares, ia cair. E eu não consigo deixar ele cair, porque ele é muito importante, ele tem propostas, eu fazer engajamento, conversar com cliente, isso para mim é muito importante. Então eu preciso conseguir escalar qualidade. Qual a solução para fazer isso? Eu preciso encontrar pessoas que tenham um conhecimento maior de gestão de produto, eu preciso empoderar essas pessoas. E depois disso preciso usar essas pessoas, para que elas me ajudem a disseminar conhecimento e disseminar confiança para as outras pessoas. 

Então, eu tenho chamado de Cavaleiros do Apocalipse, eu não tenho os primeiros Cavaleiros do Apocalipse, eu não tenho o primeiro grupo de pessoas que antes da minha entrada, já eram percebidas como potenciais ou como products managers, para que essas pessoas formem o primeiro grupo e que esse grupo me ajude a escalar. Se eu pego cada pessoa dessas que tem uma experiência de gestão de produto e eu começo a falar: “cada uma de vocês vai mentorar 5 pessoas”, já fica divertido, porque eu trouxe 25 pessoas e consigo chegar a 100 com muito mais qualidade. 

E o meu trabalho não é de mentorar 100 pessoas, é mentorar 20, 20 que vão fazer esse trabalho diferenciado de mentorar 5. E é assim que a gente conhece ramificar conhecimento sem hierarquia. Por que? Porque o objetivo meu é fazer e criar mais lead, mais principal, o objetivo desse grupo inicial que eu trouxe é fazer mais gente que quer se tornar product manager, fazer esse movimento. Não é sobre você se destacar, pelo contrário, é trazer mais gente para a sua plataforma, é trazer mais gente para o seu barco, a um ponto que você suma. E quando você sumir, você fez um ótimo trabalho, esse é o trabalho de articulação, é muito difícil lidar com pessoas, com ego, com medos, insegurança, com mercado de trabalho que é muito feroz. E dá medo, dá insegurança mesmo, não é fácil, não está sendo fácil, mas confio muito na estratégia que está sendo tomada. 

Eu sei que a gente ir no passo a passo, mantendo essa articulação que está sendo feita, inclusive com as outras lideranças, com todo o suporte que estão me dando, tenho certeza que ano que vem a nossa comunidade de produtos dentro da ThoughtWorks que é de extrema qualidade, vai estar num nível que nem sei dizer, não sei qual a palavra que eu usaria. 

Porque a gente está indo para um nível muito bacana de trabalho, de conhecimento, de compartilhamento de conteúdo, de mentoria, de discutir novos arquétipos para tecnical product manager, a gente conseguir entender como usa product engineers, por exemplo, a gente entender todos os sabores que uma pessoa de produto pode ter, qual a diferença de uma pessoa de produto de plataforma para uma pessoa que é easy face brothers? Qual é diferença que a gente pega para uma pessoa que a gente tem de produto para mobile? Qual a diferença se ela for para Web? Tem tanta discussão gostosa e de alquimia que a gente consegue trazer quando agência gente fala desse tipo de liderança, de engajamento, que é muito gostoso. Eu podia ficar aqui dias só falando sobre coisas gostosas que a gente faz quando trabalha em cima da gestão de times, depende da estrutura organizacional da empresa.
 
Teve um vídeo seu que eu vi, falava muito sobre o momento que a gente está vivendo para a pessoa se tornar uma product manager. E em 2018 eu assisti a uma palestra do Ricardo Amorim que falava sobre a história das paletas mexicanas. A analogia que ele fazia em relação as paletas, era para focar no seguinte aprendizado: a oportunidade depois que ela já passou, que todo mundo viu, ela não é mais oportunidade, porque agora está todo mundo olhando para aquilo e vai tentar colocar energia. Como se beneficiar em ser o 1º, uma das primeiras pessoas a enxergar uma onda de oportunidade chegando. Eu achei legal esse vídeo, queria que comentasse ele. O que está acontecendo no mercado que a gente está vendo na parte de design, de UX, algo similar de pessoas migrando de veterinária e indo para design, biologia e indo para design. 
 
Bernard – Primeiro, a gente tem que separar o que é tendência do que é moda. Paleta mexicana não era tendência, era moda, tecnologia é tendência. Tecnologia só cresce. Engenharia já está em hype de contratação há 7 anos. Há 7 anos eu criei uma startup de inteligência artificial para recrutamento de engenheiros. Passou a oportunidade para engenharia? Não. Pelo contrário, só aumenta a quantidade de vagas, o salário está quase igual jogador de futebol, hoje um engineer sênior ganha a mesma coisa que um juiz federal. Tem noção disso? Surreal, mas é verdade. Para mim produto tem a mesma construção, é a posição do momento junto com dados, é a posição que tem crescido, você consegue ver claramente que o mercado está carente dessa posição, mas assim como era com engenharia, a demanda pela posição é uma demanda de curto prazo.

É uma demanda para alguém sênior que entra hoje e começa amanhã, não é uma demanda para criar ou para poder desenvolver ninguém. É a mesma coisa que aconteceu com engenharia em 2014, 2015. E naquela época, eu criei um artigo, está até hoje no meu Median para quem quiser ver, eu fiz uma pesquisa sobre esse mercado e eu falei o seguinte: programadores são os novos jogadores de futebol, as empresas estão pagando cada vez mais caro para poder ter essas pessoas, igual está acontecendo com product managers. Quando você olha para o nosso mercado do Brasil e você vê que uma entrada de product managers São Paulo é R$ 7 mil, é surreal. Quando você vê que uma product manager júnior 3 antes de chegar em pleno tem um salário de R$ 10 mil numa das maiores fintechs do Brasil, como um júnior pode ganhar R$ 10 mil? Tem algo estranho. E aí isso mostra que o mercado está descompensado, claro, se pensarmos no ponto de vista individual, maravilhoso, nossa, vai ganhar muito dinheiro, sim, tudo bem. Poxa, mais pessoas vão ganhar dinheiro e poder transformar suas famílias? Claro, maravilhoso, tudo bem, só que não é sustentável. 

Não só não é sustentável, naquela época de engenharia, eu falava isso. “Daqui a pouco vai vir uma crise em precedentes que nem veio no futebol brasileiro, onde clubes estão decretando falência”. O que aconteceu ano passado? Pandemia. E a gente teve empresas famosérrimas demitindo dezenas, centenas de pessoas de tecnologia e de produto. Esse é o ponto, é aí que está a brincadeira, é muito desregulado. Entende? A gente ainda tem mais pessoas contratando. Só que as empresas perceberam que aconteceu a mesma coisa com engenharia. É impossível e insustentável você só contratar pessoas seniores, o que as empresas começaram a fazer nos últimos 6 meses? Programas de APM, programa de Produtc Manager Júnior, simples assim, porque elas precisam dar escala. Então, eu tenho dinheiro, eu vou continuar procurando seniores, mas se eu não investir aqui embaixo, eu vou estar sempre contratando os medalhões aqui em cima, é insustentável.

É a mesma coisa que futebol, a gente tem que entender isso para poder criar uma forma diferente. É muito fácil, por exemplo, você tem os medalhões, se você contrata uma pessoa que é medalhão e coloca no seu time, você consegue usar o campo magnético dela para trazer outras pessoas. Se eu entro num time, talvez algumas pessoas que gostariam de trabalhar comigo, falam: “me chama que eu vou”. As pessoas fariam essa mudança e não precisaria pagar tão mais caro para tirá-las de algumas empresas. Se você contrata uma pessoa super famosa, então, vai lá também. Você começa a fazer o mesmo paralelo, o que eu vejo em produto, é que não é moda, é tendência, vai crescer cada vez mais e mais empresas vão começar a investir na base. 

E nesse investimento na base, ele não só tem que olhar pessoas que são iniciantes na área e tem que criar um processo eletivo que seja justo para essas pessoas. Nada de pedir case, de exigir que a pessoa tenha um conhecimento prévio se a pessoa está entrando na área, sejam realmente humanas quanto a isso. E a segunda parte, investir em inclusão, em diversidade, em grupos menos favorecidos. Porque se isso não for feito na base e se isso não for feito em cima da pirâmide, nunca vai mudar. A gente vai repetir o mesmo erro que foi cometido na área de engenharia nos anos 2000, uma área extremamente elitista, com poucas oportunidades para quem faz parte de um grupo menos favorecido e com muita dificuldade de chegar até o topo porque essa pirâmide não dá oportunidades iguais para todo mundo. A gente vai olhar e falar: “putz, fizemos o mesmo erro que os outros”. Essa é a minha leitura sobre a área de produto.
 
Acontece muito em design isso, o pessoal acabou de sair de um curso de formação, está buscando um cargo júnior e a empresa pede um case ou um portfólio. E a pessoa assim: “eu acabei de sair do curso, eu mal aprendi a parada na teoria e estão me pedindo um case real para eu aplicar, o que eu faço? Eu minto? Eu invento um”. Porque também bate um desespero nas pessoas, estão pedindo, logo eu deveria ter. Espera aí, tem alguma coisa que está esquisita aí. 
 
Bernard – Um amigo meu, um dos melhores amigos que eu tenho, ele é advogado e até hoje a mãe dele paga a OAB todo ano para ele porque não sei, ela tem aquela coisa de segurança, se tudo der errado, meu filho ainda tem a carteira da OAB. Ele não executa advocacia direito tem mais de 10 anos. Ele nem mora mais no Brasil, ele mora em Alamedo que é próximo de São Francisco. Ele é um dos engenheiros de Javascript mais famosos do mundo ou o mais importante do mundo, hoje ele trabalha na mesa das pessoas que discutem como a linguagem Javascript vai evoluir no mundo todo, padrão, protocolo, não é desenvolvendo, é definindo como a linguagem vai evoluir. 

Ele é advogado, ele é incrível, mas ele é muito bom. Isso já acontece há muito tempo com engenharia, eu vejo produto a mesma coisa, tem pessoas que são alunas minhas que vieram de moda, arquitetura, da área de saúde, pessoas que são cozinheiras, biólogo, todas as áreas tem pessoas que vieram. Então, para mim é muito legal ver isso, a segunda coisa é design, um amigo trabalhou, o Moreno, eu conheci ele, eu era diretor de produto e UX, eu estava contratando designer, um dos diretores falou: “tem um cara que faz uma pós comigo, dá uma olhada se você gosta do perfil dele”. Eu falei: “o cara não tem muita experiência, está começando agora”. “Mas e daí”? Porque se ele estiver disposto a aprender, eu estou disposto a ensinar. Eu liguei para ele, muito legal o papo com ele, extremamente humano, o cara trabalhou com importação, teve uma hamburgueria, do nada ele decidiu vender a parte dele na hamburgueria e foi fazer designer. Aí eu falei: “gostei do seu perfil, quando você consegue vir para a gente conversar”? Ele falou: “estou indo para aí agora”, ele foi lá, a gente conversou e fechamos. 

Hoje em dia se não me engano é designer do Globo Esporte. Esse é o trabalho, é você pegar uma pessoa: “eu sei que você vai dar certo, deixa eu investir em você”. É isso, você sabe que vai dar certo. Eu olho o Moreno e eu posso falar de várias outras pessoas que passaram pela minha vida. Você pode duvidar de você mesmo, mas eu não duvido, eu sei que você vai dar certo. O mercado tem que permitir que as pessoas floresçam e não que as pessoas fiquem com medo, é isso que é isso o que acontece quando você coloca uma restrição na entrada porque você dá medo, você duvida das pessoas. 

E você não deveria duvidar das pessoas, deveria conversar com as pessoas e falar: “eu não estou recusando você, eu estou optando por outra pessoa com a qual eu me identifiquei mais”. Esses termos também não são melhores, entende? Quando a pessoa fala: “não passei para a próxima etapa”. Não é que você não tenha passado, é que eu tive que selecionar outra pessoa que tinha mais feat com a gente. Não é que você é ruim, você só está na prateleira que não é a prateleira que eu preciso nesse momento. 
 
Você como raiz de produto, como você garante uma boa comunicação? Tanto comunicação vindo de cima, que tipo de informações chegam para as equipes vindas da diretoria e como garante a comunicação de baixo para cima? Que tipos de informações devem chegar até a diretoria? 
 
Bernard – Esse é um dos desafios que eu ainda tenho na posição que eu estou hoje porque o gerenciamento da comunidade é uma coisa nova, a gente ainda está criando ferramentas para conseguir fazer essa comunicação da melhor forma. Então, hoje ainda é um processo trabalhoso ou com muito ruido. Se eu pudesse colocar qual o meu maior desafio, é exatamente esse: melhorar esse processo de comunicação em cima de uma gestão, para tirar ruídos, gerar mais transparência, mais clareza no que está sendo passado, uma abertura de um canal para tirar dúvidas, dar feedbacks. Esse é um desafio que eu tenho dentro desse processo. Em outras empresas era muito fácil porque você tem um canal reduzido, mas olha também o tamanho da empresa, olha o tamanho da ThoughtWorks, é normal que a gente tenha essa discussão agora, para é questão de tempo. De baixo para cima é mais fácil, é só você criar pontos de contato com as pessoas. 

Então, por exemplo, um dos programas que eu entrei e falei que a gente ia ter, agora em setembro a gente vai iniciar é um: “me pergunte o que você quiser mensal”. Todo mês eu abri um espaço na minha agenda onde eu estarei ao vivo para quem quiser falar comigo, o que quiser perguntar, eu vou contar. Isso mostra a transparência do road map que a gente está pensando para a comunidade, a gente se abre para responder perguntas e a gente mostra que está vulnerável também, que é normal, toda gestão é vulnerável. Ele vem com essa pegada de se abrir para as pessoas, para poder debater assuntos que muitas vezes você acaba se afastando como gestor. 

De cima para baixo, depende das ferramentas que você tem, se você tem um Slack ou um Teams, é muito fácil mandar uma mensagem ali e se abrir para um chat. Se você não tem uma sala específica para o seu time, é um pouco mais difícil. Se você tem um e-mail real time, que você manda e sabe que todo mundo que entrou no seu time, está nesse e-mail, é super fácil. hoje na ThoughtWorks está crescendo muito, cada semana tem mais gente na nossa comunidade de produtos, está crescendo. Toda semana aquele e-mail tem que atualizar com algumas pessoas, eu tenho que ter uma redundância de comunicação muito alta para garantir que todas as pontas estejam recebendo conteúdo. 

Mas está cada vez melhor. Hoje eu tenho várias ferramentas que já estão conseguindo me entregar, a gente está conseguindo produzir ou criar mesmo para a gente conseguir elevar esse trabalho para dentro da comunidade. Mas novamente, somos uma empresa que há 3 meses atrás, nós éramos 800 pessoas, 3 meses depois eu acho que estamos com 1.200. Por isso eu acho que a gente está melhorando esse processo de comunicação enquanto a gestão, enquanto à comunidade. Mas é isso, é você se expor e deixar bem claro que é um processo momentâneo.
 
Queria ceder o último bloco para você se despedir, passar sua mensagem final. A gente coloca também materiais de indicação, livros, sites, qualquer material que você queira indicar para as pessoas na descrição desse podcast.  
 
Bernard – Você falou de filosofia, vou trazer uma parada aqui que é um campo mitológico, mas eu gosto bastante de história, que é a história do calcanhar de Aquiles, eu queria trazer um pouco desse assunto para vocês. A gente fala muito da robustez, o que é robustez? É você ser robusto o suficiente para não sofrer uma alteração com choque, com pressão e com estresse, ok? A gente se coloca muito nesse momento difícil ou num momento de carreira, momento da nossa vida profissional, pessoal, a gente se pinta como robusto. Mas a robustez pode esconder um grande ponto crítico de fraqueza. 

E se ele for encontrado, você desaba, muito como o calcanhar de Aquiles. Aquiles banhado no rio, ganhou todo um corpo invencível, todo o corpo que foi molhado no rio invencível, só que foi segurado pelo calcanhar para poder ser banhado no Rio quando bebê. Então, logo o ponto que estava sendo segurado e que não foi molhado, foi exatamente o calcanhar dele, por isso recebeu uma flechada morrendo por causa disso. Então esse é o ponto da robustez, cuidado com a falsa robustez. Se você quer crescer no mercado, não importa a sua profissão, se você quer crescer na sua área, demonstre vulnerabilidade, entenda quais são os pontos que você pode melhorar, quais são os pontos que você pode potencializar.

E mesmo que você encontre uma fraqueza, isso não te faz uma pessoa pior, te faz ser humana e essa é a beleza de a gente ter a fraqueza, todos nós temos. Quando a gente fala de resiliência, é uma palavra que ficou muito clichê, mas é uma palavra que não acho tão confortável. Porque resiliência é o fato de você se mexer, se moldar ao longo de estresse, choque e pressão e depois voltar ao seu estado inicial. Só que toda vez que você aprende algo novo, quando você se depara com uma oportunidade de aprendizado, que você sai da sua zona de conforto, você se transforma numa pessoa melhor. Se você se transforma numa pessoa melhor, você não é uma pessoa resiliente, você é uma pessoa inteligente, esperta, você usa os momentos difíceis para se moldar uma pessoa melhor, entra o processo do Kaizen, a melhoria contínua, ser uma melhor versão todos os dias, isso para mim é uma parte muito bacana.

É você estar sempre buscando, só que se você ficar dentro da sua bolha, se você não se colocar em situações de crescimento, não se colocar em situações de aprendizado, de desconforto, você nunca vai se tornar uma pessoa melhor. Porque você está embalado a vácuo, a minha palavra final para você que está ouvindo agora: “se coloque em situações de aprendizado”. As pessoas me perguntam todos os dias: “como você consegue fazer tudo isso o que você faz? Criar vários conteúdos todos os dias, trabalhar 8 horas por dia, ter família, fazer aula de escultura, aprender teclado, estava abrindo caixa de perguntas para responder 30-40 pessoas de 2 em 2 dias, fazer live, dar aula, curso, dar mentoria”. 

Eu falo: eu me coloco em situações de aprendizado todos os dias. E isso me faz ser uma pessoa melhor todos os dias. Não precisa ser essa loucura que eu tenho, porque eu tenho uma missão bem específica, mas dentro da sua missão de vida, procure atrás de aprendizado que você todo dia se tornar uma pessoa muito melhor do que você era ontem. 
 
Muito obrigado pelo seu tempo, pela sua paciência, por nos ensinar hoje, compartilhar conhecimento, histórias. 
 
Foi muito incrível, obrigado. 
 
Agradece e encerra