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TEMPORADA 3 - EPISÓDIO 4

Jeff Gomes

Temporada 2 Episódio 4 – Jeff Gomes
PROJETO: Desenhando Produtos

Com mais de 12 anos de experiência na área de design, Jeff passou por empresas como Grupo Ediouro, Secretaria de Educação de São Paulo, Hospital Israelita Albert Einstein, Grupo Movile, Sinch e Americas.com. Hoje atua como Coordenador de UX na Ame Digital na frente de Ame Empresas, além de dedicar parte do seu tempo ao cargo de CEO da PretUX, comunidade fundada em 2020 com o objetivo de potencializar pessoas pretas para ocuparem espaços e cargos no mercado de tecnologia (www.pretux.com.br).

Livros

Pele negra, máscaras brancas – por Frantz Fanon

Racismo Estrutural –  por Silvio Almeida

Pequeno manual antirracista – por Djamila Ribeiro

Eu sei por que o pássaro canta na gaiola – por Maya Angelou

O Genocídio do negro brasileiro – por Abdias Nascimento

Ergodesign e Arquitetura de Informação: Trabalhando com o Usuário  – por Luiz Agner

Isto é Design Thinking de Serviços: Fundamentos, Ferramentas, Casos – por Marc Stickdorn, Jakob Schneider, e outros.

Mapeamento de experiências: Guia para criar valor por meio de jornadas, blueprints e diagramas – por Jim Kalbach

Lean Inception: Como alinhar pessoas e construir o produto certo – por Paulo Caroli

A cultura da experimentação – por Cristina Yamagami e Stefan H. Thomk


Está começando mais um Desenhando Produtos e Construindo Histórias. Eu sou o Josias Oliveira.

E eu sou o Leonardo Salvador.

E nós estamos aqui com ele que, mano, o bicho manda ver, o cara está construindo uma comunidade em torno de UX, um negócio chamado PetrUx, que é da hora. Ele é líder de design e vai falar conosco sobre a sua vida, a sua carreira, a sua trajetória, o que ele gosta, o que ele não gosta, desafios e tudo mais. Jefferson.

Jeff – Boa noite. Cara, essa entrada do Josias, eu estou até emocionado, nem sei como me apresentar aqui. Muito obrigado pelo convite. Para quem não me conhece, meu nome é Jeff, uns me chamam de Jefferson, outros me chamam de Jeff, mas fiquem à vontade. Sou fundador da PetrUx, comunidade voltada a ajudar pessoas pretas que estão migrando para UX, estão trabalhando com UX, enfim. O negócio é ajudar o pessoal e colocar o pessoal no mercado. E nas horas vagas… brincadeira, é o meu emprego, eu trabalho como web designer na One Digital. E é isso. Estamos aí. Estou feliz de estar aqui.

De praxe, você começa contando a sua história. De onde você veio? Que cidade você nasceu? Como você começou no design?

Jeff – Rapaz, essa história é longa, isso vai longe. Senta que lá vem história. Eu sou carioca, moro aqui em São Paulo, sobrevivo aqui em São Paulo há 3 anos. Nasci no Rio, mais especificamente em Niterói, que é ali do outro lado da ponte, para quem conhece o Rio sabe como que é, pegar a ponte engarrafada, pegar a barca lotada, essas coisas todas. Eu não tenho um conto de fadas para entrar no design, para mim não foi isso. Eu ouvi muitas histórias, que é tipo: “A minha família, o meu pai era designer, a minha mãe era arquiteta, eu me achei no design”, não, eu nem sabia o que era design. Para vocês terem uma ideia, a primeira faculdade que eu fiz foi Belas Artes, eu caí em Belas Artes, fiz 1 ano de UFRJ, gravura e escultura. Para mim foi maravilhoso, a cabeça abriu, foi fantástico. Eu estava fazendo o que eu gostava, estava mexendo com a arte, era lindo, mas só que eu venho de uma família pobre, sou filho de jardineiro com empregada doméstica. Aí você imagina, como é que esse rapaz vai fazer gravura e escultura? Eu me lembro a cara do meu pai a primeira vez que eu falei para ele: “Pai, eu botei na inscrição “gravura”, belas artes”, o meu pai: “Oi? Meu filho, você tem certeza”? E o meu pai sempre me apoiou nas minhas decisões, por mais loucas, mais surreais, ele sempre me apoiou. Mas eu sentia no olhar dele aquela sensação assim: “Meu Deus, como a gente vai sobreviver”? Assim, para quem vem de baixo, para quem vem da periferia, e o meu pai que tinha essa consciência que o estudo é uma forma de a gente transformar, não só a nossa casa, mas a nossa vida, eu acho que quando ele viu que eu ia para uma área assim, que tipo, arte no Brasil é muito elitista, a arte no mundo inteiro é muito elitista. Então quando ele percebeu isso, acho que ele deu aquele desespero, tipo: “Meu Deus, o meu filho vai sentar ali na Rio Branco, na Presidente Vargas no Rio e vai fazer quadro, vai pintar quadro lá. Eu vou ter que sustentar ele a vida toda”. Mas enfim, eu passei 1 ano na Belas Artes, aprendi bastante, foi bem interessante, mas esse 1 ano serviu para eu entender que eu queria fazer funcionalidades, como eu fazia. Eu fazia arte, mas eu não entendia como aquilo entrava no mercado. Então, eu comecei, o pessoal de desenho industrial, o design, era no andar de baixo, eu comecei a dar aquela namorada, eu falei: “Caramba, é isso. Maravilhoso, tem um negócio com o computador ali, a gente desenha mesa, ergonomia, tem um negócio chamado ergonomia, que legal”. E novamente a minha cabeça abriu, e foi o ano que eu fiz vestibular de novo e tive a sorte… sorte não, porque foi muito sofrido, de estudar muito para conseguir passar para UERJ, que é escola superior de desenho industrial no Rio de Janeiro. Eu não conhecia, mas quando eu entrei lá, quando eu pisei lá, eu falei: “Cara, era isso que eu queria fazer o tempo todo”.

E como foi? Foi bolsa? Como você conseguiu? Teve que prestar vestibular?

Jeff – Então, naquele ano era 2005, 2006, eu me lembro que desenho industrial para a UERJ só perdia para a medicina na concorrência. Tinha concorrente-vaga, alguma coisa assim, ela só perdia para a medicina, era bem complicado. E foi o ano que eu corri atrás e consegui bolsa para fazer pré-vestibular, estava naquela alta. O começo dos anos 2000 era assim, acho que foi o auge dos cursinhos pré-vestibular, e eu consegui uma bolsa num bom curso. Na verdade, eu não consegui a bolsa, o meu pai trocava serviço pela bolsa, o meu pai fazia o jardim na escola e eu fazia o curso. Então eu consegui, passei. Até hoje, eu vou até colocar aqui no meu estante de livros, eu tenho o meu nome no jornal, eu não sei se hoje ainda sai no jornal, antigamente saía na folha dirigida a lista do pessoal que passou. Aquilo foi lindo, para a minha família foi tipo, a primeira pessoa de toda a família a entrar na faculdade pública, foi fantástico. O que acontece? Você entra na faculdade dessa, você todo “pimpão”, periferia, você acha que tipo: “legal, estou trabalhando”, mas em 2 meses você já toma um tapa na cara, porque é muito diferente a realidade, é muito diferente, das pessoas que conviviam ali. Era o segundo ano de cota, então era a elite ali do Rio de Janeiro, e um grupinho de cotas ali no meio, então a gente sentia uma diferença e a gente se juntou, se uniu para poder lidar com isso. Mas enfim, é mais o baque mesmo quando você chega nesse ambiente elitista, não só de design, mas da universidade pública, infelizmente é no Brasil.

Você falou: “Grande diferença”. Quais são as diferenças que você percebeu?

Jeff – A grande diferença ao entrar na faculdade de design…

Como você se sentiu? Estou aqui, estou me sentindo descolado aqui?

Jeff – A gente sabe, a gente tem consciência que o design é emprego elitista, e muita coisa as pessoas creem que você sempre soube. Um exemplo: “Como assim? Você não fala inglês”? “Como assim? Você não foi naquele museu na França, em Paris, e viu aquela exposição”? Então, você pode imaginar como que é o dia a dia numa faculdade dessa nos anos 2000. Essas são as diferenças que você sente. É complicado você concorrer com essas experiências, é muito difícil. Não tem jeito, as pessoas que entraram naquele momento de cota, a maioria não tinha o segundo idioma, muito menos tinham saído do Rio. E para o design é muito interessante, é uma coisa que eu sempre falo para todo mundo: Veja tudo, olhe tudo. Se você tiver oportunidade, viaje, conheça museus, conheça a arte, conheça o máximo possível, isso vai ser o seu arcabouço, sua caixinha de ferramentas. Porque design é isso, você tem que ter experiências, você tem que viver, tem que ver pessoas, tem que conhecer como que a gente chegou até aqui, por que design digital está assim agora, onde a gente passou. E muito disso passa e você estuda a arte, você olhar para trás e ver o que foi feito. E muito disso está nos museus que não estão aqui, estão lá fora. Para mim foi muito difícil lidar com isso, porque eu me sentia, sendo bem transparente, eu me sentia burro. Foi a primeira vez que eu ouvi falar em Bau Rouge, eu nunca tinha ouvido falar, nem sabia o que era isso. Mas tem várias pessoas ali que vêm de família de designer, família de arquiteto, que isso já está ali dentro, isso faz uma diferença. Isso não impede que a gente chegue lá e a gente batalhe para adquirir esse conhecimento. Mas é o que eu sempre falo, você ser uma pessoa preta e periférica, você tem que batalhar duas ou três, ou quatro vezes mais. Aí o questionamento vem na sua cabeça: Por que para mim tem que ser assim? Enfim, então os primeiros anos na faculdade foi muito nessa pegada de questionar mesmo: Será que sou eu que não consigo? Ou estou no ambiente errado? Será que eu não deveria estar aqui? Enfim, é troll, para quem estuda design, quem entra na graduação, entra numa faculdade elitista, tanto no Rio, quanto em São Paulo e outras capitais, é brabo, porque você vai ter que concorrer com essas pessoas, e a saúde mental vai por água abaixo. Então tem que ter um trabalho ali de autoconhecimento, enfim.

De alguma maneira você é colocado a prova, você é testado ali. O que, na sua visão, fez com que você se mantivesse e não desistisse?

Jeff – Sendo bem sincero contigo, eu não tive a opção de desistir, não tem. Eu tinha que dar certo, eu tenho que dar certo, a minha família depende disso hoje, os meus pais dependem disso. A diferença é essa, você não tem aquela segunda opção, então você vai dar um jeito. Isso para mim foi muito marcante, porque durante toda a minha faculdade, o tempo de graduação, eu acho que por alto, eu tive 4 empreendimentos, desde vender camisa até abrir loja, até abrir agência de publicidade. Enfim, é você tentando sobreviver dentro desse ambiente, você começa a achar alternativas, porque você não tem a opção de não fazer aquilo. Isso para mim é muito marcante, porque eu sempre fui muito empreendedor, eu sempre tentei puxar as pessoas no meu grupo, aquelas pessoas também periféricas, sempre falei: “Cara, vamos abrir um negócio, a gente já sabe o Photoshop, já sabe o design. Vamos abrir uma empresa de design, nós já somos profissionais de design”, eu estava no segundo ano de faculdade, sem nenhuma noção. Mas é o sentimento de tipo, você tem que sobreviver, tem que dar um jeito. E além disso, você tem que patrocinar a faculdade, porque fazer design não é barato, em 2000 não era barato, hoje não é barato, que é uma das coisas que a gente trabalha bastante dentro da Pretux, que a gente também tinha essa parte da educação. O ensino é tão caro. Um dos pilares nosso é justamente isso, levar educação e design gratuito para quem não tem condições de pagar, pessoas pretas que não têm condição de pagar. Porque eu acredito no design como elemento transformador, eu acho que a gente consegue mudar a sociedade através do design. Enfim, parece meio batido, vocês já devem ter ouvido bastante, mas eu acredito nisso, eu acredito que dá para mudar a nossa realidade, especialmente aqui no Brasil, através do design. Para mim aconteceu isso, eu não tinha a mínima noção do que era o design e transformou a minha vida completamente. E hoje eu uso o design não só para o trabalho, para a minha vida pessoal, para a forma como eu me organizo, a forma como eu escuto as pessoas que estão próximas de mim, a forma como eu tenho empatia hoje com meus pais, com as pessoas que eu gosto. Isso vem muito de estar ali no campo de design tentando entender o usuário, tentando se pôr no lugar dele. Enfim, acho que é importante trazer isso, o quanto o design pode ser transformador, enquanto a gente tem uma força. Enfim, eu estou voltando a minha linha do tempo, depois desses 5 anos de faculdade.

Você comentou ali que vocês se uniram para tentar conseguir superar algumas coisas. Eu queria que você comentasse um pouco sobre isso. O que vocês geralmente faziam? Qual era o contraponto? Aonde vocês se apoiavam?

Jeff – Na verdade, você se junta porque você se enxerga no outro, você enxerga as dores ali, e para a gente ter volume, ter número. Porque a gente tinha as mesmas dores, as dores financeiras, questão na família, enfim. Então as nossas discussões eram sempre muito próximas, era muito fácil a gente conversar, a gente desenvolveu o projeto juntos, porque a gente entende que talvez o outro ficou 2 dias sem ir à faculdade porque não tinha dinheiro, talvez, para a passagem. E talvez, a gente consiga ajudar de alguma forma. Ou talvez, a gente não tenha, que já aconteceu comigo, a gente não tem o material para desenvolver um projeto e a gente tem que pedir ao diretor da faculdade para pagar o material para a gente. Então, você sozinho é mais difícil fazer isso, quando a gente se junta a gente consegue também se posicionar melhor. Então, era muito pautado em torno disso, das nossas dores e o que a gente conseguia fazer para melhorar a nossa jornada ali dentro. Teve pessoas que deixaram a faculdade, não tem jeito. É uma faculdade bem custosa, seja financeira, seja no seu tempo, porque, pelo menos, a UERJ, não sei se agora mudou, mas ela era integral, então você chegava de manhã e saía só a tarde. Então, como você arruma um emprego? Arruma um bico ali? Não tem. Enfim, então era muito pautado em cima disso, a gente se ajudar ali para alavancar um ao outro.

Quando você sai da faculdade, se formou. Qual foi a primeira ideia depois de se formar? “Vamos montar uma empresa, vamos fazer alguma coisa”, ou, “vou procurar emprego”?

Jeff – A primeira coisa na cabeça é: “Vamos dominar o mundo”. Agora falaram que eu sou designer, eu tenho o diploma, eu posso ir com tudo. Não, brincadeira. Pelo menos, eu tentei no início fazer uma programação de carreira, eu queria muito trabalhar em escritório tradicional de design, e queria trabalhar em agência de publicidade. E eu consegui fazer isso. Eu trabalhei em escritório tradicional no Rio de Janeiro, chamado Traço Design, e isso te traz uma qualidade absurda, te traz o que eu costumo dizer para todo o pessoal, todas as pessoas que estão migrando, eu falo assim: “Você é chato. Se você não é chato, você precisa ser chato para ser designer”, porque todo designer tem que ser chato, ele tem que ser criterioso. “Ah, está um pouquinho para o lado”, não, não está bom. É isso que tem que ser. Eu aprendi a ser assim trabalhando com o design tradicional, sentando ali, medindo a tipografia, olhando prova de cor. Uma coisa muito engraçada que eu me lembro, que foi 2010, por aí, a gente estava começando a fazer algumas coisas de web, algumas coisas dos portais, a gente fechava a poltrona ali, olhando a cor no monitor, para ver se estava certinho. Hoje eu paro e olho para trás, falo: “Caramba, o quanto a gente evoluiu, quanto a gente mudou”, porque eram hábitos que hoje a gente não tem mais, seja pela dinâmica do trabalho e por outras questões. Mas o meu primeiro emprego foi trabalhar nessa agência, nesse escritório de design. Depois eu fui para uma agência de publicidade. Você aprende a fazer o certo no escritório de design e você aprende a fazer o rápido na agência de publicidade. Nem sempre o rápido é o certo, mas é rápido, então você ganha ritmo, ganha rapidez para produzir, para mim isso foi ótimo, foi 1 ano e pouco, mais ou menos, trabalhando. Deu para crescer bastante e pegar ritmo. Depois disso, eu fiquei ali na agência, chegou uma hora que eu falei: “Cara, vou empreender”, eu já tinha essa vontade desde a faculdade, e abri a minha própria empresa. Aproveitei 1 ou 2 clientes que eu já tinha como freela e abri a minha empresa, abri a Agille Design e fiquei, mais ou menos, 1 ano e meio. Era justamente no momento em que estava ruminando que tinha um curso de web master, dentro do curso de web master tinha usabilidade, tinha acessibilidade já, já falava sobre isso, e eu ouvi assim por alto, sabe quando você ouve nos corredores, naquela área escura, falando assim: “UX. Experiência do usuário”. Eu ouvi assim, mas eu comecei a fazer uma pós junto, nesse momento, em web master, comecei a estudar usabilidade, enfim. Eu já tinha estudado um pouco na faculdade, mas era mais focado em design de produto, produto físico mesmo. Então essa pós me deu uma base legal para atuar tanto na minha empresa, quanto para o resto da minha carreira. Esse 1 ano e meio que eu fiquei na minha empresa, eu atendia em algumas indústrias aqui de São Paulo, algumas empresas de Brasília também, naquela época era muito comum empresas atenderem agências e escritórios do Brasil. Então a gente era uma empresa no Rio, que a gente atendia um escritório em São Paulo e outro escritório em Brasília. Foi bom enquanto durou, igual a todo casamento, mas chegou uma hora que não deu certo. Como primeira empresa, acho que para a maioria das pessoas a primeira empresa sempre vai quebrar, não vai dar certo. Se alguém falou o contrário, é mentira, provavelmente abriu uma empresa quando era criança, não sabia e quebrou. Mas quebrou a minha empresa, não deu certo. Para mim seria uma baita experiência ali com administração, enfim, gestão, para mim foi ótimo, porque foi um tapa na cara de muita coisa, de administrar negócios. Foi onde eu voltei para o mercado, voltei para trabalhar no mercado editorial. Que foi o mercado que eu fiquei mais tempo, fiquei durante 5 anos. Foi bacana, foi interessante.

Editorial é gráfico?

Jeff – Isso, é gráfico. Mas só que durante esses 5 anos, eu acabei pegando muitas demandas do digital também. Inclusive, foi o momento que eu comecei na minha segunda pós, que é design de interação, e começou a casar os assuntos. Ali para mim foi quando começou a conta fechar. Sabe aquele momento da sua vida que você começa a falar: “Caramba, aprendi usabilidade na faculdade para produto físico”, eu fui fazer web master, acessibilidade, usuário em centro, já tinha visto um pouco antes. Aí nessa segunda pós que eu fui fazer, que era bem focado mesmo em interação, ali fechou todas as dúvidas que eu tinha, eu falei: “Caramba, isso é lindo, isso é fantástico, é isso”. E justamente eu estava na editora e eu comecei a aplicar ali muita coisa, a editora tentava passar um processo de informação digital, e foi um momento interessante, eu fui crescendo dentro da empresa, tive a oportunidade de ir testando as ferramentas que eu estava aprendendo na pós. Foi bacana, foram 5 anos bem interessante, deu para crescer bastante.

E como você está vendo o mercado agora? As pessoas que estão entrando, que estão vendo o UX design?

Jeff – Eu acho que vale a pena a gente, talvez, dividir de alguma forma. Quando você me faz essa pergunta, eu fico pensando assim: “Que pessoas são essas”? A gente está falando do prisma da minha comunidade, de pessoas que estão migrando agora? Pessoas que estão na periferia da sociedade, para essas pessoas, o UX design é uma oportunidade de vida. São pessoas que, algumas tem formações em outras áreas, que estão há 2 anos desempregadas, e quando olham para o design, para o UX, é uma oportunidade delas mudarem a vida delas e da família delas. Mas quando você olha para o mercado, você olha para o indivíduo que tem ali os seus privilégios, não é uma questão de sobrevivência, é uma questão de evoluir na carreira, são outras questões ali envolvidas, são questões menos…. Como eu posso dizer?

Somente relacionadas diretamente a sobrevivência?

Jeff – É. Você planta para poder jantar. Então, é menos ligado a sobrevivência e mais ligado ao crescimento profissional. É isso. Então, tem esses aspectos que eu acho importante a gente trazer. Eu estou muito presente dentro da comunidade, vendo acontecer isso e, às vezes, quando eu escuto em outros círculos as pessoas falando, as pessoas esquecem desse detalhe, desse fator do design. Aí eu retomo lá atrás o que eu falei, que o design pode ser transformador na sociedade, ele pode ser um elemento para transformar o que a gente está presenciando. E está acontecendo isso. Eu vejo isso acontecendo ainda. Você vê pessoas, claro que depois de um período estudando, ganhando bolsa, fazendo cursos, ela vai evoluindo e conseguindo virar a chave ali, e mudar não só a vida dela, mas da família dela também. Então eu acho que vale a pena olhar para isso, talvez, olhar com mais carinho, quando futuramente a gente for discutir qual o futuro do design, qual é o futuro do profissional de UX, porque não é todo mundo que a gente vai começar a questionar isso. Tudo se transforma. Talvez amanhã não exista mais esse profissional. E aí? A gente novamente vai criar essa separação, que impeça que essas pessoas periféricas cheguem à nossa bolha que a gente vive aqui do design? A gente novamente vai seguir nessa jornada? Ou a gente vai parar e refletir assim: “Teve um momento lá que as pessoas conseguiam fazer uma formação, fazer outro curso, fazer migração e ganhar um salário digno trabalhando com design”. Se a gente for mudar agora, transformar em outro UX, agora é outro nome, faz outra coisa, a gente tem que olhar para essas pessoas, a gente tem que trazer elas, porque, senão, a gente vai novamente repetindo, todo erro que a gente teve sobe.

Jeff, o que você falaria para quem está começando agora no design? Quais dicas você daria para quem quer entrar nessa área? Para você, quais são as qualidades que ele tem que ter?

Jeff – Eu diria: “Respira, respira, respira”. É sério, porque está acontecendo uma coisa que me preocupa muito, que é a educação, a empresa, o mercado, agindo de formas que não estão ajudando, para quem vai entrar no mercado. Você tem a parte educacional dizendo que você vai fazer um curso e você vai ganhar R$ 12.000 no dia seguinte.

Tem gente fazendo isso?

Jeff – Tem.

Nem vamos polemizar, não é?

Jeff – Não, vontade não falta. Mas enfim. E você tem o mercado aí que não olha muito em desenvolver o profissional. Sabe o que ele quer? O mercado quer o cara sênior, que é o cara já pleno. O mercado não quer pegar um júnior, ou alguém que está entrando e trabalhar em cima. Mas quando eu falo “mercado”, eu estou pegando o todo assim, mercado que você vê exceções sim, você vê algumas empresas, a gente tem contato com algumas empresas que prezam por isso, em desenvolver, mas o mercado brasileiro como um todo quer isso, ele quer: “Olha, eu quero especialista em design system, com 5 idiomas e com experiência em banking”. Entendeu? Então, tem esse movimento que eu acho que não está ajudando para quem está entrando, eu acho não, eu tenho certeza, não ajuda para quem está migrando, para quem está entrando, porque você cria uma ansiedade tão grande nas pessoas, que isso é péssimo, isso é ruim. Eu tenho vivenciado situações dentro da comunidade, que as pessoas estão chegando no extremo, sabe? Porque algumas apostaram todo o dinheiro fazendo curso, mas não conseguiram entrar no mercado. A gente sabe nas entrelinhas o que acontece. Por que ela fez isso? Porque ela abre o LinkedIn e está lá: “Faça um curso e ganhe R$ 12.000. Tem 200 vagas na empresa tal, tem 300 vagas na empresa tal. Venha para cá”, não sabem que essas vagas são só para pessoas sênior, plenos, que falam 5 idiomas, enfim. Então, me preocupa muito isso. Eu falaria para essas pessoas assim: “Respira, cara. E tenta achar uma brecha, seja estratégico”, é o que eu falo sempre para as pessoas que eu mentoro, “seja estratégico”. A gente tem que tomar cuidado, acima de tudo, com a nossa cabeça, com a nossa saúde mental, é isso que pode derrubar a gente. O que você tem de experiência? De onde você vem? Sei lá, “eu fiz biologia”, você sabe alguma coisa sobre pesquisa? Já leu alguma coisa sobre isso? Talvez seja o ponto de você desenvolver aqui em UX. Pega alguma disciplina, algum skill que você teve anteriormente e tenta colocar ali para ela com a carreira de UX, e vê aonde que se encaixa. Porque se você não fizer isso, o que vai acontecer? Você vai abrir o LinkedIn, vai estar lá: “Aprenda UX, aprenda tudo, aprenda ágil”, já era, você já começa a se desesperar, a crise de ansiedade, ladeira abaixo. Então, é tentar fazer um paralelo com o que você tem mais facilidade. E começa aos poucos. O que eu gosto de recomendar é sempre assim: Tenha um mentor, tenha alguém para poder te guiar, enfim. Hoje nós temos o LinkedIn, seja cara de pau, vai lá, chama alguém lá e fala: “Preciso de um help aqui, preciso de ajuda”. Então, além de respirar e tentar achar o seu ponto de contato com o UX, procure uma mentoria, isso é fundamental, precisa ter alguém ali para falar assim: “Cara, respira, vai dar certo”.

Uma das coisas que eu tenho visto é que as empresas, em linhas gerais, elas não estão com muito tempo para perder, porque “eu preciso fazer tal coisa, eu preciso correr, porque o concorrente está fazendo aquilo e eu tenho que fazer isso, eu tenho essa entrega” e tal. Esse é um modelo que persiste desde a revolução industrial. A escola é para formar trabalhadores e as empresas são para pegar esses trabalhadores e “bora, que a gente tem que fazer”, tem que apertar botão, tem que apertar parafuso, na época era apertar parafuso, na época da construção dos carros Ford, agora é apertar botão. Só que tem outro conceito de trabalho, que é quando quem está na gestão, quem está na liderança começa a enxergar um problema de execução, não mais como um problema de execução, mas agora como um problema de aprendizagem. E o quanto as empresas estão dando espaço para quem é gestor, e eu acho que você está trabalhando com gestão agora, coordenação e tal…

Jeff – Isso.

Para trabalhar no aprendizado das pessoas dentro do trabalho.

Jeff – Na verdade, essas empresas estão… o meu sentimento é que nada disso é no amor, nenhuma movimentação dessa é no amor, é na dor. Então as empresas sentiram, então elas perceberam que tem que começar a trazer o conhecimento para dentro da empresa, trazer de alguma forma, e isso pode alavancar a parte de você formar dentro. Como eu falei, talvez isso seja uma dor, porque as empresas não estão conseguindo pegar fora, então, talvez, se eu formar dentro eu consigo já ter o profissional aqui dentro. É bom, acontece a movimentação, mas é ruim porque sempre é na dor, eu sinto que ainda não é estratégico, não é a longo prazo. Eu tenho o sentimento de empresa Brasil, quando eu faço um paralelo com empresas que eu tive contato de fora, a minha última experiência foi uma empresa sueca, que no Brasil a gente tem um sentimento de urgência tão desesperador, tão eminente, que em outros países não existe. Eu presenciei situações, onde a gente estava fazendo um sprint, o que em outra squad fora do país você tem um roadmap ali de 6 meses, e a gente fazendo um sprint de 15 dias. Por que a gente está fazendo isso? Aí você começa a olhar para cima, olhar para outras esferas de produto, de negócios, enfim, você vê que todo mundo está nessa pegada de correr com as coisas, e você percebe que começa a se atropelar, você começa a deixar as fases de lado. Mas porquê? Esse é um questionamento que eu faço. Por que a gente tem esse sentimento? Talvez seja algo histórico, onde a gente tem que sempre provar que a gente é bom, a gente entrega rápido, a gente é a mão de obra, que vai lá e faz. Talvez seja algo nessa linha? Não sei. Mas isso acontece. E justamente quando você tem a oportunidade de conhecer outros times de fora, você começa a tipo: “Por quê, gente”? Por que eu estou aqui trabalhando até 20:00h, quando eu olho para o time lá de fora, dá sexta-feira, 14:00h, o pessoal vai embora porque “tenho que aproveitar o sol”, eu tenho que pensar no meu “eu”, porque se eu tiver bem, eu vou estar trabalhando bem. E a gente aqui não. Então, eu acho que é uma coisa para a gente começar a refletir, começar a pensar. A gente, como liderança, a gente tem que começar a catucar essas coisas, isso não é fácil, isso vai incomodar muita gente, é fato, mas eu acho que é responsabilidade nossa aos poucos a gente questionar isso. Por que esse desespero? Por que essa correria? Por que a gente está esticando tanto a corda do nosso time? Olhando de 5, 10 anos para frente, a gente não vai chegar em nenhum lugar, e talvez com mais qualidade se a gente, talvez, tem um roadmap um pouco mais extenso, mas a gente vai conseguir abarcar todas as fases de um projeto. Enfim, é mais uma reflexão. 

Tem alguma coisa que você gostaria que a gente tivesse perguntado para você, mas a gente não perguntou?

Jeff – Acho que seria interessante uma pergunta que quando eu vou fazer uma entrevista, eu sempre fico perdido, quando alguém me pergunta assim: “O que você gosta de fazer”?

Jeff, o que você gosta de fazer?

Jeff – Josias, com essa voz de locutor, eu fico até emocionado aqui. Eu vou ser bem sincero com você, Josias. Hoje, o que eu amo fazer é descer e cuidar da minha horta que está lá embaixo. Eu tenho um MVP de fazenda no meu quintal. É sério, está pensando o que? Tenho, eu tenho um roadmap, de 60 anos para lá, fazenda. Então eu tenho um roadmap para cumprir, agora estou com um MVP no quintal, estou com alface. Isso é o que eu gosto de fazer hoje. Eu me questionava muito, as pessoas me perguntavam isso, geralmente a pessoa fala assim: “Eu gosto de design, gosto de ler livro de design”, alguma coisa relacionada a design. Não, gente, eu não gosto, isso é o meio que eu encontrei na minha vida profissional para chegar nos objetivos que eu quero, e eu tento fazer da melhor forma, para que dê o mais certo possível. O que eu gosto é de ir na minha geladeira, abrir uma cerveja e ver as minhas plantas, fazer o meu MVP. É isso que eu gosto.

A gente vai colocar a descrição, colocamos informações sobre livros, artigos, qualquer coisa que você queira compartilhar. O link para as comunidades. Fica tudo descrito devidamente, cadastrado, registrado e catalogado na descrição deste áudio. Muito obrigado pelo seu tempo, pela sua paciência de nos aturar durante quase 1 hora.

Jeff – Nada, eu que agradeço. É uma honra, você sabe que eu gosto de você demais, tenho o maior carinho. Conte sempre comigo, para o que precisar pode chamar, é uma honra vir aqui falar um pouquinho. Foi um prazer conhecer o Leonardo também.